Falar do disco
The Dark Side Of The Moon, de 1973, não é tarefa fácil. Por isso, comecemos pelo começo: a capa do disco. Imagine que um exemplar do disco (de vinil, é importante ressaltar) esteja em suas mãos. Você desembrulha a embalagem e se depara com tal imagem: qual seria sua reação? o que pensaria a respeito? Pode não parecer, mas esta capa é tão importante quanto as músicas, o que só pode ser compreendido após a apreciação de toda a obra. Um detalhe importante é que ela não apresenta nada escrito, apenas mostra a decomposição do feixe de luz branca em seus diversos espectros. Tudo isso, em conjunto com o estranho nome do álbum, cria estranheza, curiosidade.
É hora de tocar o disco! Expectativa alta! E a primeira faixa começa quase que em silêncio... até que começam batidas ritmadas, um coração começando a pulsar junto com os primeiros sons que não são acordes. Pessoas falam, riem, gritam, máquinas registradoras funcionando, até avião , ou helicóptero, decolando. Tudo isso em questão de apreensivos segundos até que surge o primeiro acorde. E a sequência é uma batida cadenciada na bateria, guitarras melódicas cheias de efeitos, um baixo marcante, uso de slides, teclados acompanhando as guitarras com acordes inspirados no jazz e no blues... e o som transcende. "Speak to Me/Breathe" é a primeira faixa do lado A do disco. É um convite feito pelo disco, é a sua epígrafe. A letra trata de nascimento e de tudo o que virá pela frente (
"...smiles you'll give and tears you'll cry...")
.
Num momento os slides das guitarras cessam e, após um acorde de transição no teclado, sintetizadores. começam.
"On the run", a segunda faixa, é definitivamente uma maratona, uma corrida, acelerada e vertginosa. Mais eletrizante que qualquer
trance de hoje. A beleza desta faixa, vai além dos sons. Deve-se apreciar nela o trabalho desenvolvido pelos técnicos de sons para montar toda a música utilizando apenas os poucos recursos de edição de áudio da época. E o fim da música é uma sensacional explosão.
Na sequência, relógios despertando de forma ensurdecedora, um tic-tac dispara, assim como uma bela linha de baixo junto com uma introdução muito bem elaborada na guitarra.
"Time/Breathe (Reprise)" é, ao mesmo tempo, uma constatação, uma reflexão e uma lição: o que fazemos com o tempo que temos? Tudo isso ainda é entremeado por um espetacular e longo solo de guitarra, bastante característico do rock progressivo. Também é importante destacar a transição para a parte final da música que tem sonoridade semelhante à da primeira faixa.
Encerrando o lado A do disco,
"The Great Gig In The Sky". Impossível de definir. Impossível de descrever. A beleza do som do teclado e da guitarra, o desespero dos vocais, a calmaria dos vocais, a fúria dos vocais... Essa música trata de lamento, dor, ânsia, desespero, medo, êxtase, etc...
A estas alturas, quem ouve o disco já está atônito! Especialmente com o fato de que as transições entre as faixas são imperceptíveis. Tudo parece ser uma faixa só, uma história só.
Mudando para o lado B, uma máquina registradora, uma linha de baixo e um clássico do rock:
"Money". Aqui, o dinheiro, a riqueza corrompem a sociedade:
"money, get away". Mas o dinheiro e a riqueza são ambicionados:
"money, it's a hit". A relação sórdida entre o homem e o dinheiro é muito bem traduzida também no solo de saxofone e no solo de guitarra.
A segunda faixa do lado B,
"Us and Them", apresenta, talvez, uma das mais belas melodias já compostas. A progressão de notas no teclado é simplesmente perfeita. O saxofone melancólico dá ainda mais brilho à composição, que faz contraposições entre diversos elementos (
"me and you", "us and them", "black and blue") para, então, concluir que estes elementos são comuns e semelhantes (
"we are only ordinary men", "up and down, and in the end it's only round and round and round").
"Any Colour You Like" é a música seguinte. Um instrumental psicodélico, repleto de efeitos de guitarra e sintetizadores sempre com o acompanhamento do baixo e da bateria.
"Brain Damage" é a quarta faixa do lado B. Constitui uma bela homenagem a Syd Barret , um dos fundadores do Pink Floyd. Um tema sobre a loucura que atinge a todos subconscientemente.
O
gran finale fica a cargo de
"Eclipse" (um nome muito sugestivo, por sinal), que diz que tudo feito em vida, acaba com a morte, indicada pelas batidas de coração, desta vez, enfraquecendo (ao contrário do início do álbum, em que as batidas vão ganhando força), anunciando o fim do disco.
Após o fim, a sensação que se tem é a de que diversas experiências foram vividas enquanto a música simplesmente tocava. A capa do disco também passa a fazer sentido, uma vez que a passagem do feixe de luz pelo prisma decompondo-se em diversos espectros (que na contra-capa passam novamente pelo prisma e se recompõem nun feixe de luz) passa a ser claramente uma metáfora para a transição entre a vida e a morte.
Enfim, uma obra-prima!
L. C. D. M. F. Boechat
Alguns vídeos para degustação:
Speak to me/BreatheMoneyUs and ThemDocumentário - The History Channel (Parte 1)The Dark Side Of OzInstrumentosP.S.: Peço desculpas pela minha visão de extrema admiração pelo disco, e também pela análise superficial que foi feita. O álbum é tão complexo e denso que é difícil destrinchá-lo sempre por um caminho.